sábado, junho 17, 2006

Enfim, alguém acordou

Nos anos 60, dois de meus amigos mais estudiosos, José Antônio Adura e Roberto Negrão de Lima, freqüentavam os cursos de Ciências Sociais e Filosofia na célebre escola da Rua Maria Antônia. Diziam que eu deveria fazer o mesmo, e de vez em quando me levavam até lá para eu colher umas amostras do ensino recebido. Ouvi tudo com a maior atenção e, depois de várias experiências, cheguei à conclusão de que ali só havia um professor inteligente: Oliveiros da Silva Ferreira. Logo depois do tiroteio com os alunos do Mackenzie a faculdade mudou para o Butantã e ponderei que não valia a pena atravessar a capital paulista, chacoalhando num ônibus, cheirando sovaco da população sofredora, para ouvir uma só aula interessante depois de horas e horas perdidas em injeções de babaquice marxista (e notem que eu próprio me considerava um marxista na ocasião).

Fiquei em casa, mas continuei acompanhando os artigos de Oliveiros no Estadão, sempre lúcidos e valiosos. Só uma coisa atrapalhava o colunista: aquele ar de solenidade uspiana, carga pesada e inútil que ele colhera do meio social e que se impregnara na sua pessoa, como na dos demais professores da instituição, formando uma espécie de segunda natureza. Impondo entre os alunos um temor reverencial quase eclesiástico, aquele repertório típico de gestos, entonações e trejeitos verbais que assinalava um professor da USP a vários metros de distância contrastava com a índole revolucionária das crenças ali dominantes e, para o observador de fora, tinha um efeito irresistivelmente cômico. A diferença era que em Oliveiros o manto professoral era a vestimenta de um esforço intelectual genuíno, enquanto nos outros era o substitutivo perfeito da atividade cerebral.

Com o tempo, notei que o aplomb uspiano, com sua abundância de ponderações fingidamente inconclusivas, seu uso abusivo de galicismos afetados e suas expressões de exagerada deferência a uma corporação de imbecis, acabou por se espalhar em todas as universidades do Brasil - talvez como efeito do sucesso simultâneo de Fernando Henrique Cardoso e do PT -, erigindo-se em estilo oficial do academismo caipira e tornando-se ainda mais senhorial e atemorizante por meio da adoção geral do vocabulário desconstrucionista que oblitera nos ouvintes o último resíduo de inteligência. Qualquer que fosse o caso, em Oliveiros o estilo, definitivamente, não era o homem - era apenas a sua redução cerimonial à estatura ambiente. Fui e continuo sendo seu leitor e admirador, num país onde as coisas a admirar, no domínio intelectual, já eram poucas e agora se aproximam velozmente da quantidade negativa.

Por isso fiquei muito feliz ao notar, no Estadão do último dia 10, que ele finalmente subscreveu minha tese de que o Brasil se encontra em plena revolução comunista, em avançadíssimo estado de implementação. Fiel às hesitações corporativas de praxe, capazes de desacelerar até uma inteligência inquieta como a sua, ainda em 2001, num amável debate na Casa Paroquial da PUC de São Paulo, e depois em 2002, na inauguração do Instituto de Filosofia e Estudos Interdisciplinares no Rio de Janeiro, ele relutava em me dar razão, preferindo apostar na progressiva dissolução das ambições revolucionárias petistas num mundo de economia globalizada e entusiasmo geral pela democracia.

Lembro-me de ter-lhe objetado, ao menos numa dessas ocasiões, que ele baseava seu diagnóstico integralmente em informações colhidas da mídia, sem o suporte das fontes primárias, sobretudo as Atas das Assembléias do Foro de São Paulo, que comprovavam a longa associação do PT com organizações de terroristas e narcotraficantes, bem como a existência de uma estratégia revolucionária comum entre essas organizações e os partidos oficiais de esquerda, que assim arrancavam sua máscara de legalismo e provavam ser tão criminosos quanto seus parceiros.

A grande mídia, ocultando persistentemente essas fontes, tornava inacessível, mesmo a cérebros privilegiados como o do meu interlocutor, a percepção do maior esquema revolucionário já posto em ação na história humana, destinado a entregar nas mãos dos comunistas um continente inteiro de uma só vez. A ocultação, por seu turno, era demasiado longa e sistemática para poder ser explicada pela mera preguiça ou incompetência, indicando antes uma cumplicidade ao menos passiva de boa parte da classe jornalística e de vários empresários de mídia na consecução do projeto comunista.

Os fatos que comprovavam a minha tese eram mais que abundantes, e nada se podia alegar contra ele exceto convicções gerais baseadas no hábito e na confiança. Eu reconhecia que argumentar contra o hábito e a confiança me dava ares de maluco, mas era melhor parecer maluco do que sê-lo realmente, como acontecia com todos os que continuavam a apostar, sem conhecimento dos fatos, na honorabilidade intrínseca das forças esquerdistas em ascensão.

Não sei se, nesse ínterim, Oliveiros estudou as fontes que lhe recomendei. Mas, no artigo "O ensaio geral" ele mostra ter compreendido que a invasão do Congresso não foi episódio isolado, mas sim etapa da consecução de um plano complexo, abrangente e bem elaborado para a conquista do poder absoluto e a instauração de uma ditadura comunista no Brasil. Uma vez que se entende isso, é impossível não perceber, retroativamente, que todas as demonstrações de lealdade democrática do PT e partidos associados foram apenas manobras diversionistas, de vez que coincidiram, no tempo, com o planejamento da investida revolucionária agora em curso.

Não costumo dar importância à aprovação ou desaprovação das minhas opiniões. A quantidade de aplausos ou vaias é apenas a expressão mais brega do argumentum auctoritatis, de validade cognitiva absolutamente nula. Mas a aprovação diferenciada, vinda de estudioso empenhado seriamente no conhecimento da realidade, é sempre alguma coisa.

Se consegui alertar Oliveiros da Silva Ferreira, isso mostra que ainda há alguns neurônios saudáveis no debilitado cérebro nacional.
Olavo de Carvalho

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O ENSAIO GERAL (8/6/2006) - Por Oliveiros S. Ferreira

Quero ser claro desde o início: a invasão da Câmara dos Deputados no dia 6 de junho de 2006 (início da “Era da Besta”...?) foi o ensaio geral para a tomada do Estado. O filme apreendido pela Polícia Legislativa e exibido na TV no dia seguinte é disso a prova: foi um ato cuidadosamente preparado para a ocupação do Salão Verde, chamado pelo instrutor de “Salão de Baile”.
Se não na cabeça daqueles que depredaram o que encontravam pela frente, o ensaio fez parte do plano do ex-guerrilheiro que é líder do movimento. Este, sabiamente, no momento em que tudo acontecia, estava no interior da Casa, procurando ser recebido pelo presidente Rebelo. Depois, pôde dizer que a violência fora espontânea... E houve quem acreditasse que assim era, ou se esforçasse por interpretar o episódio como mais uma manifestação legítima de quem reclamava a reforma agrária.
Está no Eclesiastes que Deus, quando quer perder os tolos, primeiro tira-lhes a razão. No malfadado dia em que os 6 se encontraram no calendário, prestigiados comentaristas, cientistas políticos de nome, todos se esqueceram de que o assalto fora a um dos Poderes do Estado e deram sua explicação “científica” e “abalizada” do que ocorrera.
O comentarista deitou falação, no seu terno bem cortado: entre os responsáveis pelo fato deveria ser colocado o Congresso, porque não cassara todos os do mensalão; o Judiciário, porque não fizera a reforma da lei de execução penal (como se mudar leis fosse função do Judiciário), e o Executivo, cujo presidente recebe todo mundo e está preocupado com a eleição.
O cientista político foi na mesma direção, só que se limitando a acusar o Congresso: perdeu legitimidade quando deixou de cassar todos do mensalão. Todos aqueles que nós, que estamos do lado de fora da Corporação Legislativa, desejamos que sejam cassados. Ao investir contra um dos Poderes da República, especialmente contra o Congresso, o analista e o cientista político simplesmente coonestaram a invasão e deram a clara demonstração de que haviam perdido o juízo.
A prova de que Deus está com os humildes se mostrou com os comentários que ouvi de dois amigos: um, reproduziu o que sua doméstica lhe dissera: “Ninguém mais respeita ninguém, doutor. Estou com medo. Acho que vai haver uma revolução”. O outro comentou a resposta de um pedreiro que mora na periferia: “lá, mata-se todos os dias e ninguém sabe quem é. O Lula, esse não manda nada.” A resposta da doméstica trouxe-me à memória o que um motorista de táxi me dissera depois que o PCC fez o que queria: “Em 15 anos, vai haver uma revolução”.
Vamos refletir sobre os 15 anos. Nas suas poucas luzes, o motorista traduzia um fino raciocínio sociológico (sem ter ido à escola): para que haja uma revolução, é necessário que o tempo passe para que as pessoas não acreditem mais em uma solução dentro da Lei para seus problemas. Ou como dizia alguém que entendia de fato de revolução: a massa faz a revolução quando tem o amargo sentimento de não suportar mais o status quo. Um e outro teriam razão — mas o raciocínio não se aplica ao Brasil por duas razões simples: uma, que a massa brasileira suporta bem o status quo, na medida em que, como diz a sabedoria popular, em tempo de buriti, cada um cuida de si. Em outras palavras, a sociedade se tornou individualista. Outra, porque a revolução já começou.
Se quisermos fixar uma data — assim como dizemos que o Renascimento começou num dado dia de 1453, quando os turcos tomaram Constantinopla — podemos dizer que a revolução começou em 1979, poucos dias depois da posse do presidente João Batista Figueiredo. O movimento sindical “novo”, então liderado por Luís Inácio da Silva, vulgo Lula, declarou uma grande greve no ABC. Multitudinária! O Tribunal Regional do Trabalho declarou a greve ilegal. O líder do movimento fez que o movimento continuasse em claro desafio a um ramo do Poder Judiciário, portanto, um braço do Estado.
Se para os responsáveis pela democracia que se instaurava (os Atos Institucionais haviam cessado a 1° de janeiro) não seria de bom tom que Lula fosse processado pela lei de Segurança Nacional, ao menos poderia ter sido enquadrado no artigo do Código Penal que dispõe sobre a desobediência à Justiça. Nada feito: na democracia que começava, não seria correto atingir essa liderança que havia criado um novo sindicalismo para derrotar o de Vargas, de pelegos. O ministro do Trabalho do presidente Figueiredo, senhor Murilo Macedo, veio a São Paulo, conferenciou com Lula e a greve terminou. O Poder Judiciário foi desmoralizado, ultrapassado — pela Presidência da República — e entre os mortos e os feridos, ninguém se machucou.
Muito bem, o Poder de Estado fora assaltado. Mas a paz reinou em Santo André e no ABC. Aí começou tudo: o Estado recuou diante da possibilidade de confronto com grevistas e do risco, maior, de ser acusado de ditatorial por todos os que falavam e escreviam. Na cabeça dos grevistas, das lideranças, pelo menos, gravou-se a lição: desde que o Estado fosse ameaçado com a possibilidade de conflitos e de sangue, seriam vitoriosos.
Esse foi o primeiro ato do drama. O segundo foram as ações violentas da CUT. É preciso lembrar que a CUT, quando se constituiu, era uma organização ilegal porque a CLT não considerava a possibilidade de se constituir uma central única de trabalhadores. Pela legislação ordinária datada de 1943, que não sofrera grandes alterações até aquela data, só poderia haver confederações de categorias, que deveriam agir isoladamente. Apesar disso, a CUT se organizou — quando apenas no Governo Sarney é que a modificação da lei permitiria que se constituísse legalmente.
As primeiras ações da CUT foram, como todos nós lembramos, de uma violência nunca vista nas relações trabalhistas. Em São José dos Campos e no ABC, ela deu demonstração de uma nova tática de luta: a ocupação das fábricas. Em muitas ocasiões, as ocupações incluíam atos de violência física contra pessoas e a propriedade: quem quisesse furar a greve sofreria ultrajes maiores ou menores, um dos quais era ser preso naquilo que se chamou de “chiqueirinho”. Em uma das ocasiões, creio que no ABC, os operários da CUT que ocupavam uma montadora, puseram fogo em vários automóveis já prontos.
A reação a esses atos de violência foi mais de parte da sociedade do que do Governo. Afora a reação da sociedade, preocupada com a escalada da violência, houve outro fator que levou a CUT a mudar sua tática: indústrias mudaram-se do ABC e os novos líderes compreenderam que a violência na luta sindical não era produtiva do ponto de vista de ganhos salariais.
É preciso ver que essas ações da CUT configuravam três tipos de violência (sem querer copiar dom Helder Câmara e suas quatro violências): contra as pessoas, contra a propriedade e contra a Lei. A rigor, poder-se-á dizer que as três podem ser resumidas na última, pois a violência contra a pessoa e a propriedade são crimes previstos no Código Penal. Concordo, mas qualifico minha posição: a violência contra a pessoa e a violência contra a propriedade são sentidas emocionalmente — e sublinho o sentidas emocionalmente — por todas as pessoas que dela foram vítimas e pelos que se arrepiam com esse tipo de ação. A violência contra a Lei, essa é feita contra um fato que, para a maioria das pessoas, é mais abstrato do que um desejo de ser multimilionário. Quem não tem idéia de seus direitos — e essa é a posição da maioria dos brasileiros — muito menos sentirá que a Lei foi violada. A reação emocional dá-se contra o ataque à pessoa e à propriedade — não contra a norma jurídica, abstrata como o Estado. O Governo, repitamos à exaustão, esse é concreto para o cidadão (que, com isso, demonstra ser mais súdito do que cidadão); o Estado é uma abstração. É, como diria um teórico do Direito, a comunidade criada pela ordem jurídica. A maioria da população, dos eleitores (semi-alfabetizados ou analfabetos) saberá que significa isto?
Esse fato — a violência contra a Lei — confirmou a revolução que se iniciava. E que foi incentivada, no plano do coração e das mentes, pela propaganda contrária aos Governos de 1964 a 1985, que se acrescentou a uma série de fatos sociais que contribuíram para enfraquecer o tecido social e acovardar os governadores de Estado — que inclusive se recusavam a fazer qualquer coisa para evitar greves nas Policias Militares, pois estavam certos, como me disse o então comandante do IV Exército, que o Exército entraria em força para assegurar a ordem pública.
As ocupações de terra pelo MST foram o ingrediente final para que a idéia de revolução se instalasse no coração e nas mentes das lideranças, de desempregados e daqueles que ainda sonhavam com Che Guevara e o socialismo cubano.
Ponha-se a débito dos Governos Federais o fato de estarem vindo financiando organizações legalmente registradas e controladas pelo MST, que é uma entidade fantasma, pois não tem registro legal – organizações que, reconhecidas como ONGs, mascaram seus objetivos.
Não responsabilizemos o Governo Federal por culpa que não tem em primeira instância. Quem responde pela manutenção da ordem pública é a instância estadual. Esta é quem deveria ter realizado as primeiras ações repressivas contra invasões de terra — os Governos estaduais e a Justiça estadual. Em São Paulo, mesmo, houve caso em que um juiz não concedeu a imissão de posse porque a invasão fora feita apenas em uma porcentagem da fazenda... A maioria dos governadores, se não todos, foi omissa, preferindo jogar a responsabilidade pela inação nos ombros do Governo Federal.
Aquela idéia que acompanhou o fim da greve no ABC em 1979 transformou-se hoje em moeda corrente: as invasões de terra são feitas por mais de 100 pessoas (ou 500). A desocupação da terra por mandado judicial e emprego das PMs levaria a um resultado danoso para a imagem da autoridade. Portanto, nada se faz — ou, perdão: entregaram-se e ainda hoje se entregam cestas básicas para alimentar as famílias que ocupam ilegalmente as terras.
A revolução já foi feita na medida em que a idéia de Lei e a de Estado já não mais faz parte da maneira de pensar dessas pessoas que violam a lei. A doméstica de meu amigo, aquela a que me referi no início, tem razão em ter medo; é que o pedreiro também tem razão, pois Lula nada manda. Nada manda porque os que, na sociedade, poderiam reclamar a imposição da Lei têm receio de serem chamados de reacionários, de fascistas e, ainda não, mas em breve, de gorilas — como em 1963 e 1964.
O ensaio geral para a tomada do Poder foi feito.
Aguardemos, confortavelmente sentados, que apareça, no meio do MST, do MLST ou dos Sem Teto urbanos, alguém com a audácia de Adolf Hitler ou Lênin para que se tome de fato o poder de Estado — contra nós, porque totalitário. Então, o novo Governo, que será dirigido por um partido, traçará suas diretivas e dará suas ordens às Forças Armadas como no III Reich e na URSS.

3 comentários:

Anônimo disse...

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Anônimo disse...

Best regards from NY! » » »

Anônimo disse...

Excellent, love it! » »