domingo, junho 11, 2006

ASCO!!!

Não costumo perder o controle das palavras, quando debato. No Senado, jamais agredi ou fui impolido com quem debati, nem recebi o menor agravo verbal ou físico. Defendíamos nossas posições no regime que a oposição, em 1978, ainda chamava de ditadura militar. Estranha ditadura que, já nas eleições de 1965, perdera os governos de Minas Gerais, berço do golpe de Estado preventivo de 64, e do Rio de Janeiro, onde Carlos Lacerda, um dos chefes civis da contra-revolução, perdeu para a oposição a eleição do sucessor. Ditadura que mantinha todas as liberdades civis e políticas, inclusive a da imprensa livre, até que foram restringidas pelo AI-5, por seu turno revogado, e com ele todas as medidas de exceção, pela Emenda Constitucional nº 11, de outubro de 1978.

Mas continuou a oposição a denominar ditatorial, em 1979/80, o governo que defendi como seu líder, quando votamos a anistia. Debati com Paulo Brossard, Pedro Simon, Marcos Freire, Roberto Saturnino, Gilvan Rocha, Franco Montoro e Itamar Franco, entre outros. Defendemos nossos pontos de vista em linguagem civilizada. Não mentíamos; argumentávamos. Cultivávamos a honradez e a probidade. Todos eles ficaram meus amigos e muito contribuíram para a redemocratização do país. Inconformados com a polidez mútua que mantivemos, houve quem, eleito muito posteriormente, dissesse que o Senado “era um sepulcro caiado”, porque não encontrava nos anais os insultos soezes de que já faziam uso.

Quem reproduziu as palavras indignadas de Cristo, profligando os fariseus, jactava-se de pertencer ao PT, um partido ético e moralmente renovador. Não se passou muito tempo, veio a desiludir-se com os desvios de conduta do PT, que um dos seus fundadores históricos disse que procedia como meliante. O partido, confundido com uma República sindical, assaltara o Estado por ele aparelhado. A máscara ética mostrou que apenas escondia meliantes, ou seja, bandidos, em quadrilhas expropriadoras do dinheiro público ou de estranhos empréstimos com aval de Valério.

O governo tudo fez para impedir a instalação de CPI, diante dos escândalos que a imprensa investigativa revelava à farta, trazendo as provas das denúncias de Roberto Jefferson, que não as tinha. Isso foi apelidado de denuncismo. O mesmo governo violou um princípio parlamentar, o de ter em CPI a presidência ou a relatoria de um parlamentar da oposição, pois a CPI é um instrumento da oposição. Todas tiveram presidente e relator governistas. A dignidade deles, ajudada pela pressão popular, impede que a CPI venha a ser pura farsa. Convocou depoentes citados com provas de corrupção. Começou uma peça teatral dedicada ao cinismo mais revoltante.

Repugna ouvir os depoimentos dos convocados pelas CPIs e pelo Conselho de Ética da Câmara dos Deputados. Mentem sordidamente, diante dos fatos, como se esses houvessem sido uma conspiração de falseadores de dados verdadeiros. Usam o caradurismo dos meliantes, que o petista horrorizado assim os denominou. Adotam, como ajuda, o truque de desqualificar as fontes que comprovam o assalto aos cofres da União, falaciosamente confundidos com “recursos não contabillizados” para caixa 2 do partido da ética e da moral. Confusão que obedece à orientação de caríssimos advogados a serviço de esconder a fraude ou deixá-la incidir em crimes de punição menor. Disse a mídia que isso foi orientado por ninguém menos que o ministro da Justiça, famoso penalista que já absolveu acusados de crimes horrendos, mas deve ser engano porque o ministro é autor de uma frase violenta sobre o caixa 2, “uma bandidagem”. Nas acareações, atingem o ápice da simulação. Dizem que não conhecem ninguém, que nunca receberam dinheiro, nada obstante seus nomes figurarem nos extratos bancários. Se não os próprios nomes, os dos intermediários.

Aos dois irmãos do assassinado Celso Daniel, o chefe de gabinete do presidente Lula, com a mais serena fisionomia, sem mexer um músculo da face, diz nunca ter dito o que lhes disse, quando amigos. Ou os irmãos não passariam de paranóicos, ou — mais provável — Carvalho é o mais perfeito êmulo de Tartufo, de Moliére. Há até momentos hilariantes. Um deles se deu com o ex-tesoureiro de um dos partidos venais, a quem a secretária de Marcos Valério, aquela que ficava com os dedos doridos de tanto contar cédulas e entregar a beneficiários, o identificou como um dos que recebiam o “excremento do demônio”. Com a mesma hipocrisia de outros, ele negou. Negar é o verbo mais usado pelos que conjugaram o outro verbo que o padre Vieira preferia para o caso: surrupiar. O deslavado mentiroso afirmou desconhecê-la. Rindo, com ar de deboche, ela de dedo em riste lhe perguntou: “E aquele encontro no hotel Grã Bitar?”. A platéia gargalhou e o mentiroso silenciou.

É a isso que assistimos nesta pobre república da estrela vermelha, na qual José Dirceu, jogado às urtigas pelo palácio, beneficia-se de liminares que o ministro Eros Grau concede, escandalizando os leigos, porque leigos somos, e o ministro está no STF porque tem “notório saber”. Logo... A amizade com Dirceu em nada afetou seu senso de justiça. Dirceu, que tem fôlego de gato, tudo indica que não será cassado neste ano. Quanto a 2006, é prudente não arriscar.

Tudo isso provoca asco, nojo, palavras que nunca usei em política.

Jarbas Passarinho no Correio Brasiliense 1 de novembro de 2005

Um comentário:

Anônimo disse...

Keep up the good work »