Mistério companheiro
Acreditando-se em tudo o que dizem o PT e a empresa têxtil Coteminas, de propriedade do vice-presidente José Alencar, os companheiros fizeram uma encomenda de R$ 2,7 milhões de camisetas ao preço de R$ 12 milhões.
Nessa conta, cada camiseta saiu por R$ 4,40. Um veterano de campanhas eleitorais assegura que nunca pagou mais de R$ 3.
Natasha em Brasília
Madame Natasha não recebe seu mensalão nem ganha camisetas, mas trabalha de graça pelo idioma. Concedeu uma de suas bolsas de estudo ao doutor Paulo Bernardo, pelo português rudimentar da placa de seu carro oficial. Ela diz o seguinte:
“Ministro Estado - Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão”.
Natasha acredita ministro não leu placa carro.
Cesta na manga
Lula tem uma carta na manga. Em maio do ano que vem ele poderá propor um sólido aumento do salário-mínimo, coisa de 20%, elevando-o para R$ 360, equivalentes a US$ 160. Será inferior aos R$ 384 aprovados no Senado em agosto pela oposição. O reajuste permitirá que o PT diga: recebemos o governo com um salário-mínimo que comprava 1,2 cestas básicas. Agora ele compra 1,7 cestas.
Se a oposição resolver brigar, terá um péssimo precedente. Aderirá com 52 anos de atraso ao Manifesto dos Coronéis, assinado em 1954 contra o reajuste determinado por Getúlio Vargas.
Fala, Dirceu
Na sua entrevista à “Fórum”, José Dirceu repetiu uma frase da esquerda chilena, trazida para a defesa de Lula pela professora Maria Conceição Tavares:
“É um governo de merda, mas é o meu governo.”
Tudo bem, o governo é deles. E o resto da piada, fica para quem?
(A entrevista, dada aos repórteres Renato Rovai, Frédi Vasconcelos, Glauco Faria e Eduardo Maretti, é a melhor peça produzida por uma cabeça petista desde que a crise começou. Quando não convence, revela.)
Frei Gushiken
Acusado por Henrique Pizzolato, ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil, de manipular verbas de publicidade da empresa, o comissário Luiz Gushiken acusou-o de ser um “confuso por natureza”.
Se o tivesse chamado de mentiroso, teria crédito.
O comissariado petista insiste em se comportar com o recato dos frades sempre que algum companheiro conta o que acontecia no convento renascentista em que transformaram o governo.
O risco Palocci de credibilidade
Antonio Palocci tornou-se um título de baixa credibilidade. Três episódios ocorridos em menos de um mês mostram isso. Relacionam-se com sua credibilidade econômica, política e pessoal.
Começando pela economia. No dia 11 de novembro, falando no Senado, Palocci disse o seguinte:
— Nós estamos entrando neste momento — não tenho nenhuma dúvida de afirmar isto — em um dos mais importantes e longos ciclos de crescimento que a economia brasileira experimentou nas últimas décadas. Ele se iniciou no segundo semestre de 2003, apresenta crescimento do processo de produção há oito trimestres consecutivos.
Dezenove dias depois, o IBGE divulgou que no terceiro trimestre, aquele que terminara em setembro, o PIB contraíra-se em 1,2%. Palocci não mentiu aos senadores, apenas propagou o triunfalismo de “Nosso Guia”.
Na mesma reunião o ministro disse que “não me furtarei, em qualquer instância que for, a prestar o esclarecimento que for necessário”. Repetiu o raciocínio mais duas vezes, recorrendo sempre ao incômodo verbo furtar. Convidado a comparecer à CPI dos Bingos, furtou-se. Em seguida, manobrou o furto de sua convocação. Vale lembrar que, convocado, não poderia furtar-se. Quem acreditou na cleptomania verbal do ministro comprou um mico.
Palocci chutou sua credibilidade pessoal quando desmentiu que tivesse voado num avião-companheiro. Disse assim: “Fala-se também que eu utilizei um avião particular para ir a uma feira na minha cidade (...). Ofereci aos órgãos de imprensa uma comprovação da FAB, (…) mas infelizmente não fui ouvido.” Foi ouvido. Seu desmentido de que tivesse usado o jato Citation do empresário Roberto Colnaghi para ir ao Agrishow em Ribeirão Preto foi publicado na “Folha de S. Paulo”. Nele Palocci dizia que “não pegou carona no avião”. Não pegou naquela ocasião. Colnaghi admitiu que Palocci usou seu avião para fazer o percurso Brasília-Ribeirão Preto-Brasília em companhia de José Genoino, então presidente do PT. Genoino confirmara à repórter Catia Seabra que “fiz essa viagem a convite de Palocci”. O ministro sempre poderá dizer que não foi ao Agrishow no avião que em 2002 fora usado para transportar as misteriosas caixas confiadas a Vladimir Poleto.
Isso não reduz a questão central: como ministro, Palocci usou o avião de Colnaghi para brincar de dono dos ares.
Em nenhum dos três casos Palocci mentiu. O problema não é dele, é das pessoas que nele acreditam. Ficou difícil para Palocci se submeter ao teste universal de credibilidade: uma relação de confiança é iníqua sempre que é melhor não confiar do que confiar.
O fator Rebelo de astúcia
Odeputado Aldo Rebelo assegurou seu lugar na história do Parlamento. Sob sua presidência irá à votação nesta semana a marmota da Emenda Constitucional que reabre o varejão das aliança$ eleitorai$.
O texto vindo do Senado, datado de junho de 2002, diz assim:
“Esta Emenda Constitucional entrará em vigor na data de sua publicação, aplicando-se às eleições que ocorrerão no ano de 2002.”
Ou seja, os doutores legislam sobre um pleito que já ocorreu. Parece apenas uma distração de redator. É uma punga.
O projeto aprovado pelos senadores em 2002 encalhou na Câmara. Virou múmia. Ressuscitaram-na porque, se os deputados corrigissem a data para 2006, a Emenda deveria voltar ao Senado para nova votação. Sob a presidência de Rebelo, finge-se uma absurda vontade de legislar sobre o que já aconteceu para assegurar conveniências que estão acontecendo.
Aprovada a emenda, qualquer deputado poderá pedir um destaque, suprimindo a data.
Fala-se muito do senador Auro de Moura Andrade (1915-1982), que atrasava o relógio do plenário em votações encrencadas. Rebelo se associou a coisa muito mais criativa. E fez isso ocupando a cadeira onde já estiveram Célio Borja e Ulysses Guimarães.
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