terça-feira, dezembro 13, 2005

Por falar em golpismo

Clóvis Rossi para a FSP
HONG KONG - O presidente Lula está certíssimo ao falar de "golpismo". Mas está erradíssimo no timing. O golpe, presidente, foi dado faz pouco mais de três anos e anunciado nesta Folha por um certo George Soros, megainvestidor ou megaespeculador, ao gosto de cada qual.
O golpe veio numa frase de Soros: "É Serra ou o caos". Foi no início de junho do ano eleitoral.
Como não deu Serra, deu o caos ou, ao menos, fortíssima turbulência, registrada neste mesmo espaço graças às preciosas estatísticas que Mauro Zafalon compila: entre a frase de Soros e as imediações da posse de Lula, em janeiro de 2003, o dólar subiu 35%, o risco-país cresceu 20%, os juros tiveram uma elevação de 7 pontos percentuais e a inflação multiplicou-se por 14.
Esse é o tipo de golpe que se dá hoje em dia. Apertando teclinhas de computador nos centros financeiros em vez de botar tanques nas ruas.
José Dirceu, então presidente nacional do PT, reagiu à previsão de Soros com a acusação de que era uma "chantagem". Era. Deu certo.
A vítima, Luiz Inácio Lula da Silva, rendeu-se. Basta recuperar outro texto da época, manchete de "O Globo": "Lula põe banqueiro do PSDB no BC e mercado ainda desconfia".
Esse e tantíssimos outros dados apenas confirmaram a tese que Soros expôs então: "Na Roma antiga, só votavam os romanos. No capitalismo global moderno, só votam os americanos, os brasileiros não votam". Os brasileiros até votaram, contra Soros ou o candidato que Soros preferia, mas o voto acabou anulado, porque o preferido do eleitorado ficou do lado dos golpistas.
Faz a política dos golpistas a tal ponto que todos os indicadores (dólar, risco-país, inflação e até os juros) voltaram aos níveis pré-golpe.
A diferença, pois, com o golpismo convencional é que Lula não foi deposto. Depôs suas bandeiras, na discutível hipótese de que as tivesse de fato, e se tornou um falastrão de irrelevâncias.
@ - crossi@uol.com.br