segunda-feira, maio 22, 2006

Evo no covil dos leões

"Quando o morde e assopra Evo Morales, presidente da Bolívia, esteve em Paris logo após a confusão em Viena, foi recebido com pompa e circunstância pelo prefeito parisiense Bertrand Delanoë e ciceroneado por ninguém menos que Danielle Mitterand. Morales estava caindo numa arapuca e não se dava conta.

A viúva do ex-presidente francês levou Morales para se encontrar com os dirigentes do Conselho Geral de Val-de-Marne. Danielle Mitterand é presidente da France Libertè, ONG que atua na Bolívia. Ela esteve na reunião entre Morales e Delanoë, que se apressou a assegurar que a Prefeitura ajudará entidades bolivianas e ONGs que trabalham naquele país.

A Val-de-Marne vem desenvolvendo, há anos, diversos projetos no âmbito da água que "podem interessar" ao atual governo boliviano. Ela foi criada em 2002 para reunir uma coalizão de 28 associações de diferentes países contra a privatização e a comercialização da água. Dos outros, claro.

O mandatário boliviano colocou, sorridente, a cabeça na boca do leão sem prestar atenção à senha que fecha a arapuca: ONGs internacionais na Bolívia contra a privatização e a comercialização da água. O Brasil já caiu na armadilha das instituições estrangeiras que defendem os índios.

Organizações não-governamentais são a melhor forma jurídica e financeira de se obrigar um país a fazer o que o dominador deseja sem a intervenção armada e fazendo de conta que é para o bem deles mesmos. Contratando funcionários locais e pagando-lhes um bom salário, mas mantendo o comando e a agenda, o interessado afirma que seu propósito é o de preservar o meio ambiente, defender os direitos humanos e implantar ou manter a democracia. A ONU é a primeira, a maior e a mais poderosa das ONGs e a Unesco seu braço cultural.

E assim vão se instalando nas regiões que lhes interessam. A Amazônia é uma delas. Representando 56,4% do território brasileiro, contendo, aproximadamente, um milhão de espécies da fauna e da flora mundiais, incluindo 2.500 espécies de árvores, 1.800 de aves e 2.000 de peixes, sendo que um rio no Brasil tem mais espécies de peixes do que todos os rios dos EUA, a Amazônia é alvo da cobiça americana desde meados
de 1850.

As tentativas de invasão, aquisição, anexação, protetorado e, agora, "propriedade da humanidade", são reais e constam de diversos estudos, programas, relatórios e outros documentos de autoridades militares e civis dos EUA ao longo dos dois últimos séculos, conforme nos mostra a professora Lydia M. Garner, da Southwest Texas State University, em artigo ao Centro Brasileiro de Estudos Estratégicos.

Na verdade, com o fim da Guerra Fria, instalou-se a Nova Ordem Mundial, não mais atrás de comunistas e assemelhados, mas contra a soberania dos povos do Terceiro Mundo, e a Amazônia voltou a ser um dos principais itens da agenda internacional.

Os americanos estiveram aqui em 1851-52 mapeando as bacias hidrográficas dos rios Prata e Amazonas, já tentaram "medidas assegurando para cidadãos americanos a navegação do Amazonas", se esforçaram em estabelecer bases comerciais no Norte do Brasil e deram uma de João-sem-braço num documento firmado com nosso País sobre a extração, distribuição e comercialização da borracha natural durante a II Guerra.

Até juraram que a Bacia Amazônica era uma extensão do vale do rio Mississipi (!), que a foz do maior rio do mundo era mais próxima de Nova York do que do Rio de Janeiro, por isso era natural que fosse dos EUA. E em 1861, com a libertação dos seus escravos, Lincoln pretendeu comprar a Amazônia para aqui instalar os negros libertos. Lá ninguém os queria, como ainda não os querem. Porém, o Imperador D. Pedro II e seus ministros nacionalistas sempre barraram as investidas ianques. Depois deles, a Amazônia veio sendo protegida pelo acaso.

Com a eclosão da Guerra Civil Americana, os EUA adiaram seus projetos imperialistas para o norte brasileiro e não se apropriaram da borracha natural porque acabou a II Guerra e surgiu a borracha sintética, do petróleo. Como o Brasil cresceu e apareceu, mudaram de estratégia e de tática.
A ONU passou a estimular a existência de ONGs. Entre os seus objetivos estão o de conseguir o status de observadora internacional e poder criar leis internas conforme os interesses dos donos internacionais do poder. A WWF, a Human Rights e a Greenpeace são exemplos e os Partidos Verdes pretendem ser seus prolongamentos políticos.

O conceito de soberania nacional perfeita foi dividido em soberania nacional e soberania dos povos. Alegando defender a soberania dos panamenhos, os EUA invadiram aquele país e tiraram o general Noriega do poder. Ocorreu coisa semelhante com João Goulart. Eles não eram "amigos".

E, em nome da soberania nacional, os americanos forçaram o Iraque a se retirar do Kwait. É aqui que mora o perigo para o Brasil. Ter de se retirar dos territórios indígenas na Amazônia, permitindo que sejam "cuidados, educados e protegidos" pelos missionários das ONGs estrangeiras lá instaladas.

Um artigo recente da revista "Problemas brasileiros" afirma que "é difícil acreditar que um carismático francês de 76 anos, de fala lenta e andar compassado por conta da saúde debilitada, encabece a lista dos jurados de morte pelos fazendeiros e madeireiros que transformaram o Pará num apimentado caldeirão de conflitos fundiários." O autor refere-se a Henri des Roziers, advogado e frade dominicano "que há quase três décadas escolheu o Brasil como palco de sua militância social e religiosa". E continua francês!

Desistindo do confronto com o governo brasileiro, os criadores da Nova Ordem Mundial, não por acaso os únicos com assento no Conselho de Segurança da ONU, que eles criaram, EUA, França, Inglaterra, Rússia e China, os principais vencedores da II Guerra, partiram para pressionar a opinião pública interna. A imprensa começou a ser instruída de que a Amazônia deve ser intocada, que não se pode fazer extração, beneficiamentos, comercialização e colonização organizada de brasileiros lá. Assim, destruirão o "pulmão do mundo".

Ocorre que a Amazônia é simplesmente a região mais rica do planeta. Detém 20% de toda a escassa água doce do mundo, a maior diversidade de fauna e flora, jazidas enormes de gás, petróleo, ouro, diamantes, nióbio, urânio e tório. Do nióbio faz-se o metal dos foguetes dos programas espaciais dos EUA e da Rússia, e o urânio e tório, enriquecidos, formam a base da energia atômica, que tanto serve de combustível como de arma. A revista "IstoÉ" da semana de 14 de maio revela que a Polícia Federal estourou um esquema de contrabando do minério radioativo para países da Europa, Ásia e África, em particular a Rússia e a Coréia do Norte. Olha eles aí de novo!

Os criadores da Nova Ordem Mundial não querem que o Brasil lance mão dos fabulosos e riquíssimos recursos da Amazônia porque, então, se tornará o país mais rico de todos. Em vez de levar nosso nióbio, diamantes, ouro, pedras preciosas, mogno, aves raras e urânio a preço de banana, contrabandeados, eles terão de pagar preço de mercado. Mas por que pagar caro se basta gastar uns trocados iludindo a imprensa e botando ONGs como fachada para seus interesses "humanitários"?

Não sei de ONGs estrangeiras defendendo nossos negros, pelo menos com tanto ardor quanto o fazem com os índios brasileiros. Mas só índios das reservas amazônicas. Os abandonados nas estradas e nas cidades não é com elas. Será por serem eles os donos da terra? Bingo! Este foi outro conceito estratégico que a Nova Ordem Mundial incutiu no povo brasileiro via mídia e em seguida pressionou nossos governos a criarem enormes áreas indígenas. A recente reserva Raposa da Serra do Sol ocupa mais da metade de Roraima. Território dos ianomâmis, ela faz fronteira com Venezuela e Suriname. E quem está ao lado do Suriname? Guiana Francesa.

Sempre que há um grave problema com os índios, o governo brasileiro é ameaçado, através da imprensa internacional, com a soberania dos povos. Ou seja, se o Brasil não cuidar direitinho dos seus indígenas, qualquer (aqui, claro, são os EUA) membro do Conselho de Segurança pode evocar a defesa da soberania do índio brasileiro e invadir militarmente a reserva, como aconteceu com o Iraque e o Afeganistão. Tudo pelo social dos índios! Se eles estão em área vital para os interesses econômicos dos poderosos, pode ser apenas uma coincidência, não é?

A professora americana Lydia Garner revela que outra tática da Nova Ordem Mundial foi a criação de fronteiras sem controle absoluto por seus vizinhos, a chamada soft national boundaries. É aqui que Morales vai cair do cavalo e pode nos levar junto. Não vai cair do cavalo que ele diz que o Barão do Rio Branco deu aos bolivianos em troca do Acre, mas do cavalo branco de Napoleão. Agora garbosamente a serviço da ONG de Mitterand.

Ao entrar no jogo da ONG francesa, que reúne representantes de 28 interessados na água amazônica, e aceitar que ela não seja privatizável nem comercializável, pelos seus donos, óbvio, o presidente da Bolívia botou o Brasil em outra sinuca.

Fechando o contrato com madame, Morales decreta o fim da fronteira Brasil-Bolívia no que toca à extração da água. Vale lembrar que os americanos já estão na Colômbia. Os ongueiros poderão esticar em solo brasileiro seus empreendimentos industriais de extração da água e, ao reagirmos, estaremos simplesmente atacando a Bolívia, que mais desejamos manter como parceira no jogo internacional.
Ah, esse Morales...
Paulo França