domingo, abril 30, 2006

Nos aposentos do príncipe

A frase pode ser vista como efeito de desconhecimento, o que me pareceria uma conclusão exagerada. Não seria de todo irreal debitá-la à perda de senso que é a megalomania do sucesso. Mas também é possível atribuí-la a impulsos paranóicos. Haverá quem a tome por leviandade demagógica, não faltará quem nela identifique apenas um deboche. Faça a seu escolha. Eis a frase, servida como complemento à advertência "tudo o que eu quero na vida é fazer comparação":
"Não queria comparar o meu governo com o governo passado, porque isso seria como um Corinthians e Íbis. Queria comparar o nosso governo com toda a República, com o mundo todo, para ver se em algum momento na história houve um governo com tanta participação dos trabalhadores".
A comparação que Lula faz todos os dias lhe parece, agora, covardia. E é. Se não perdeu de todo o senso e as medidas, e quer mesmo fazer comparações, tem duas bem à mão. Não precisa ir "a toda a República, ao mundo todo". Compare o seu governo aos frutos sociais, econômicos e institucionais dos governos de José Sarney e Itamar Franco. O primeiro foi o mais acusado de ineficiência nos últimos 40 anos, ou desde João Goulart. O outro durou apenas dois anos e teve de improvisar-se, nas urgências do pós-impeachment. Apesar disso, é com eles que Lula pode fazer a comparação esclarecedora.
Não é recomendável que a faça em público. O lugar apropriado é o recôndito dos palácios, um daqueles aposentos onde Fernando Henrique gostava de levar conhecidos para mostrar o que chamava de "os aposentos do príncipe", os seus. A finalidade da comparação não seria submeter a castigo público, como punição para a persistência em iludir platéias. Seria apenas, digamos, ortopédica: fazer o presidente da República pôr os pés no chão, como primeiro passo em direção às responsabilidades que dele o país tem esperado.
Espera que não inclui, é claro, os favorecidos com os juros lulistas, os que ganham fortunas diárias com os títulos da crescente dívida feita pelo governo Lula, os especuladores das Bolsas e os agraciados (a maioria deles ainda irrevelada) pela original política que compôs a "base governista" com a inspiração de Marcos Valério.
JANIO DE FREITAS

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