Jarbas Passarinho
No auge do movimento social O Petróleo é Nosso se entrechocavam os que queriam monopólio da exploração e os que preferiam a participação do capital estrangeiro associado ao nacional. Getúlio Vargas encaminhou um projeto que não impedia a participação do capital estrangeiro, mas na Câmara dos Deputados prevaleceu a emenda monopolista. Mais tarde, houve tentativa de retirar da Petrobrás o monopólio. Nacionalistas, porém, ficaram tranqüilos, em face da declaração taxativa do poderoso ministro da Guerra de então, general Teixeira Lott: “A Petrobrás é intocável?. Assim perdurou até o governo Fernando Henrique Cardoso, cujo pai, general, foi militante importante da campanha O Petróleo é Nosso.
Com a mudança do tempo e do mundo, vieram o colapso do comunismo na Europa e a globalização. Os marxistas, segmento forte na Petrobras, torceram os narizes, mas renderam-se à economia de mercado. A Petrobras deixou de ser a gestora do monopólio, que passou a ser controle do Estado, porém a Lei do Petróleo, de 1997, determinou que “A União manterá o controle acionário da Petrobras com a propriedade e posse de, no mínimo, 50% das ações mais uma ação do capital votante?. Permaneceu uma empresa de capital misto e passou a definir, sob leilões, os blocos a pesquisar, na maioria reservados à própria Petrobras, em alguns casos associada ela mesma a companhias estrangeiras.
Dessa natureza, com associados minoritários, descobriu as jazidas gigantescas da bacia de Santos, o petróleo do pré-sal leve. Só a província petrolífera Tupi, a primeira a ser descoberta, chegará a produzir 8 bilhões da barris, segundo estimativa da Petrobras. Mas as pesquisas indicam outros campos excedentes ao Tupi. A área inclui sete blocos que podem conter 58 bilhões de barris, o que elevaria as reservas, em vez de 8 bilhões de óleo a 50 bilhões, o que colocaria a Petrobras entre as 10 maiores companhias de petróleo do mundo. Usei o verbo no futuro do pretérito, porque em verdade não colocará, pois a Petrobras não administrará esse excesso dos limites ou franjas do Tupi, já que o governo Lula prefere criar uma companhia estatal só para isso.
Os argumentos são diversos e nenhum convence a necessidade de usurpar a Petrobras dos blocos ainda não leiloados do pré-sal para destiná-los a uma nova empresa inteiramente estatal. A decisão de não leiloar essas novas jazidas é justa. Lembra o tempo da discussão sobre os contratos de risco, uma vez que o risco é mínimo. O leilão garantiria que a pesquisa não seria uma loteria, mas a certeza do prêmio como desfrutava aquele deputado que falava com Deus. Poderia também evitar leilão e deixar as jazidas só com a pesquisa da própria Petrobras. Prefere-se a nova empresa.
Alguns — inclusive o presidente Lula — acham que somando tudo o que, de fato, é fruto de suas pesquisas, a Petrobras ficaria perigosamente muito forte. O presidente Lula traduziu isso num chiste: “Fortíssima, amanhã se elegeria primeiro o presidente da Petrobras, que nomearia o presidente da República?. Só mesmo nos dias de leitura do Barão de Itararé, do presidente, para tão sutil ironia.
Um ministro, certo de que ajudaria a intenção do presidente, lembra que “a Petrobras poderia repetir a tentativa de golpe da petrolífera venezuelana PDVSA para depor o presidente Chávez, e assim poderia fazer no Brasil?. Para ganhar mais popularidade do que já tem, o presidente, visitando a UNE, prometeu usar os recursos do petróleo do pré-sal “para resolver todos os problemas da educação?. Faltou-lhe acrescentar a saúde pública, depois do fracasso da CPMF, se estivesse numa platéia servida pelo SUS. Ademais, esquece-se de que os rios de dinheiro que virão do petróleo é quase certo que só estarão disponíveis dentro de dois anos, ou seja, no fim do seu segundo mandato. É duvidoso que vá formar uma riqueza para uso de seu sucessor. Pode, porém, coincidir com o início do terceiro...
O antiamericanismo inspirou a razão de ser da nova empresa. A estulta suposição de que possam vir a dominar a Petrobras, a Lei do Petróleo impede. Tudo a que os acionistas estrangeiros ou nacionais têm direito são os dividendos. Ainda assim Lula disse, a titulo de advertência patriótica: “50% dos acionistas da Petrobras são americanos?. A ministra-chefe da Casa Civil foi mais enfática. Paradigma do nacionalismo, acha que “petróleo tão abundante não deve ser explorado por uma empresa como a Petrobras, cujo patrimônio está em mãos de 65% de acionistas privados, nacionais e estrangeiros?. Quando o governo, buscando a auto-suficiência do consumo de petróleo e derivados, precisou investir mais na Petrobras, captou a economia dos trabalhadores brasileiros, usando até 50% dos seus Fundos de Garantia (FGTS). Agora, porque há americanos que se fizeram acionistas da Petrobras, podem vir a perder o que confiadamente aplicaram.
Não lhe faltou, ao presidente, o cacoete demagógico: “O petróleo não é da Petrobras, mas do povo?. Parece que estamos na Grécia antiga, em que Aristides, símbolo da honestidade política, foi desterrado, e Cleón, protótipo do populismo, seduziu o povo.
A explicação mais verossímil para a criação da nova estatal é ideológica: o estatismo. A Petrobras, embora coordenadora do controle acionário, ajudou, à custa de lesão ao seu patrimônio, Evo Morales. Não basta. É melhor seguir a receita de Chávez, a “pretinha?, o bônus de petróleo, para os pobres. Aqui ela seria maior.
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