quinta-feira, outubro 12, 2006

UM ENTENDIMENTO CANHESTRO DE GOLPISMO
GILBERTO BARBOSA DE FIGUEIREDO (*)

Não faz muito tempo, surgiu o primeiro indício de que alguma coisa ia mal para o lado da tão decantada ética do governo petista. O Sr. Waldomiro Diniz, auxiliar direto do Sr José Dirceu, então Ministro Chefe da Casa Civil, foi mostrado na televisão recebendo propina de um empresário de jogos.

Mais tarde, o povo brasileiro, atônito, tomou conhecimento de um esquema sórdido, onde parlamentares eram comprados pelo Governo para compor maioria na Câmara dos Deputados. O caso veio a público através da denúncia de um deputado que teve um seu protegido flagrado pelas câmeras de uma emissora de TV, no exato instante em que aceitava suborno. No momento em que não se sentiu amparado por aqueles com quem contava, detonou a rumorosa denúncia do “mensalão”, com receio, certamente, de ter de pagar sozinho, entre os parlamentares, pelo ato de seu apaniguado.

Como conseqüência da denúncia, caíram diversas personalidades, intimamente ligadas ao Presidente e a seu partido: o Ministro José Dirceu, o Presidente do PT, José Genoíno; o tesoureiro do partido, Delúbio Soares; o dirigente partidário Sílvio Pereira, que ganhou notoriedade pelo Land Rover, recebido como presente de um empresário.

Não foi necessário se esperar muito tempo para que outro escândalo viesse a assombrar a opinião pública brasileira. Agora, era a quebra do sigilo bancário do caseiro de uma mansão do Lago Sul brasiliense, conhecida como República de Ribeirão Preto. Desta feita o Ministro Antônio Palocci, e o presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso, foram os compelidos a deixar seus cargos.

Todos esses fatos ocorreram com pessoas que compunham o círculo de auxiliares próximos e amigos do Presidente. As maracutaias, para usar expressão muito de seu agrado, foram urdidas dentro do Palácio. E o que é absolutamente espantoso: o Presidente alegava, candidamente, que nada sabia.

Merece registro, no caso, a iniciativa do Procurador-Geral da República, que ofereceu denúncia contra quarenta das mais altas personalidades do Governo por formação de quadrilha, chamando o partido do Presidente de “sofisticada organização criminosa”.

Seguiu-se o caso, pouco comentado pela mídia, da distribuição ao PT de cartilhas da Secretaria de Comunicação da Presidência que, em si, já se constitui em evidente situação de abuso do poder político.

Nas vésperas do primeiro turno das eleições, surge novo escândalo, aquilo que, em nota conjunta, os presidentes dos clubes militares definiram como: “Uma tentativa de comprometimento de dois candidatos a cargos executivos com o caso da compra das ambulâncias, mediante a negociação fraudulenta de um suposto dossiê. Chantagem ou denúncia, mas com a evidente intenção de desqualificar concorrentes eleitorais. Novamente, envolvendo assessor do Presidente, pessoas importantes na hierarquia de seu Partido e dinheiro de procedência duvidosa”.

Nesse episódio constatamos a participação de figuras como: Freud Godoy, pessoa ligada ao Presidente desde de 1980; Jorge Lorenzetti, churrasqueiro de Lula e protetor de gente de sua família; Oswaldo Bargas, marido da secretária particular do Presidente e o próprio Berzoini, presidente do PT, o segundo a ser afastado do cargo, envolvido em suspeitas de atos ilícitos. E o Presidente, novamente, de nada sabia. Nega sua participação na tramóia, afirma querer discutir profundamente o problema da ética, mas ainda não foi capaz de esclarecer de onde surgiu todo esse dinheiro – o equivalente a 1,7 milhões de reais.

A campanha eleitoral pelo primeiro turno entra em sua fase decisiva e, ante a montanha de corrupção mal explicada, a população é surpreendida por outro fato inusitado. Desta feita, a desfaçatez chegou a tal ponto que até aplausos foram roubados.

Em presença de fatos de tal gravidade, políticos da oposição argüiram a impugnação moral e a impugnação jurídica do presidente-candidato. Esta última tem respaldo no Art 67, inciso IV, da lei 9100/95 que preceitua ser crime eleitoral divulgar fatos que se sabe inverídicos, distorcer informações sobre partido ou candidato de forma a influir na vontade do eleitor, sendo o delito agravado quando cometido por meio da imprensa. Por outro lado, a Lei Complementar nº 64/90 estabelece no Art 22 que qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público poderá representar à Justiça Eleitoral, solicitando investigação, para apurar abuso de poder econômico ou de autoridade, ou uso indevido de meios de comunicação social em benefício de candidato ou partido político; os incisos XIV e XV, do mesmo artigo, tratam dos procedimentos a serem adotados pelo Tribunal, se for julgada procedente a representação, mesmo quando o julgamento se der após a eleição. A lei parece bem clara, tanto que o TSE resolveu examinar o escândalo do dossiê, onde está sob suspeita a própria candidatura Lula.

Simpatizantes do atual governo, em face da embrulhada jurídica em que se meteu seu candidato, começaram a tachar de golpistas a todos quanto o acusam de haver transgredido a lei e, principalmente, àqueles que alegam haver razões jurídicas para a impugnação. Se houve ou não crime eleitoral, cabe ao TSE e somente ao TSE decidir. Agora, acusar de golpista a quem advoga o cumprimento da lei também já passa dos limites.

O entendimento universal de golpismo orienta-se justamente em sentido oposto. Golpistas são, pois, os que, mesmo antes de conhecer a decisão de um Tribunal, se preparam para pregar o descumprimento de sua sentença, desde que não seja do agrado de sua corrente política. Golpistas, com certeza, são aqueles que pretendem intimidar toda uma nação com a ameaça do emprego dos “movimentos sociais” e da violência anárquica que habitualmente acompanha suas ações, para fazer valer, a qualquer custo, suas anacrônicas idéias.

(*) O autor é General-de-Exército e Presidente do Clube Militar

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