por Dora Kramer
As piores previsões feitas quando da nomeação de Lina Maria Vieira para o comando da Receita Federal se concretizaram: o aparelhamento do aparato de fiscalização e arrecadação, uma das áreas ainda razoavelmente imunes ao loteamento partidário/sindical patrocinado pelo governo Luiz Inácio da Silva em setores-chave da administração federal.
Trata-se de um plano bem planejado e gradativamente executado. Portanto, enquanto estiverem no manche do poder governantes com esse tipo de visão (utilitária) do Estado, nada há a fazer. Não adianta reclamar, denunciar, apontar os malefícios, os retrocessos, a ótica distorcida, o espaço aberto a ilicitudes e as intenções subjacentes, porque para tudo há uma justificativa quando a decisão de governo está tomada.
Na Receita foram substituídos cinco dos seis secretários-adjuntos, os superintendentes de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo e mais os responsáveis pelas regiões Norte e Nordeste, nos últimos três meses.
Uma remodelação dessa amplitude em tão curto espaço de tempo, se fundamentada em motivações exclusivamente profissionais, teria necessariamente de ser acompanhada dos devidos esclarecimentos.
Se algo andava mal na Receita, o contribuinte tinha o direito de saber. Se a partir da nova política de remanejamento de pessoal começaria a andar melhor, o governo seria o maior interessado na divulgação e poderia merecer aplausos.
No lugar disso, o que se viu muito bem relatado na reportagem da edição de ontem do Estado foram trocas paulatinas na estrutura central e nas superintendências regionais feitas com o oficioso objetivo de substituir a "turma do Everardo" para pôr fim à influência do secretário na gestão Fernando Henrique Cardoso, Everardo Maciel.
Mas, se o critério é nebuloso, a intenção é claramente exposta: dar lugar à "turma do Unafisco", o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais, de onde saíram os novos superintendentes. Concursados todos eles, aponta a reportagem.
Só que não é a condição legal ou a capacidade técnica o que se discute, mas o comprometimento dos sindicalistas com uma causa política e o retrocesso - para não dizer o risco - que isso representa no tocante ao uso partidário da máquina do Estado.
Numa área como a Receita esse tipo de controle pode ser uma arma de potência incomensurável sobre adversários, principalmente em períodos eleitorais.
Se o governo ganhar a próxima eleição presidencial, os poucos avanços obtidos na despolitização da burocracia no governo anterior continuarão sendo anulados - exatamente como fez a aliança PMDB/PFL na Nova República em relação à estrutura herdada do regime militar - até o limite do imprevisível.
Mas, se o vencedor for da oposição e tiver da administração pública uma visão profissional, vai se deparar com o desafio de desmontar o aparelho sindical antes mesmo de manifestar o tradicional repúdio ao loteamento partidário que preside as relações entre Legislativo e Executivo e impede o Brasil de ser governado por um projeto de País, mantendo-o atrelado a planos alternados de poder.
Há quem trema só de pensar no enfrentamento do próximo governo com o PT se o partido porventura voltar derrotado da batalha de 2010 diretamente para a trincheira da oposição.
Mas há quem lembre também que pior que o embate na base do grito e da cobrança será a resistência da aliança entre ideológicos e fisiológicos que, na defesa de seus interesses, vai se movimentar ainda na fase de escolha de candidaturas dentro dos partidos. De todos eles, os oposicionistas e os governistas por adesão ou por convicção.
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