segunda-feira, novembro 05, 2007

Soberba

por Onyx Lorenzoni

A batalha do governo pela prorrogação da CPMF, conhecida como imposto do cheque, não se resume apenas à tentativa de tornar permanente um imposto que nasceu para ser provisório.

Ela servirá como teste para outra prorrogação: a do mandato do presidente Lula. Caso seja aprovada no Senado, mesmo depois de enorme desgaste, como aconteceu na Câmara, a CPMF se transformará na locomotiva que rebocará o comboio do terceiro mandato, movida pelos R$ 160 bilhões que a CPMF arrecadará até 2010. O dinheiro que deveria melhorar o sistema público de saúde turbinará a saúde política do PT e de seus aliados.

A maior evidência de que o PT tentará de tudo para emplacar o terceiro mandato é o surgimento do movimento quero-quero na Câmara, capitaneado por deputados da base, um dos quais amigo íntimo do presidente da República. Dentro de alguns dias devem apresentar Proposta de Emenda à Constituição abrindo caminho para o terceiro mandado. O raciocínio deles é simples: se ganham a batalha CPMF contra a oposição, a classe média e boa parte do empresariado, por que não tentar emplacar mais quatro anos para o presidente? Por que não impor esse casuísmo, essa excrescência? Afinal, já há o exemplo de Hugo Chávez aqui ao lado, e outro vizinho, o argentino Néstor Kirchner, prepara-se para passar a faixa para Cristina, sua mulher, e para continuar morando na Casa Rosada.

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Do pedestal de herói, Lula passará à vala comum reservada aos ditadores
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Desde Getúlio Vargas, que governou 15 anos, oito deles na ditadura do Estado Novo de 1937 com direito a presos políticos e outras vergonhas, uma manobra despudorada como essa não era tentada. Querem fazer o Brasil retroceder 70 anos quebrando o princípio da alternância no poder, um dos pilares da democracia.

Nos últimos cinco anos, o governo Lula e seus aliados conseguiram desmoralizar o Poder Legislativo e agora partem para a desmoralização do Executivo, arquitetando este golpe chamado terceiro mandato. E se vingar o terceiro, por que não tentar o quarto ou o quinto? É lamentável que, após o enorme esforço para a redemocratização do Brasil, através da consolidação de um sistema de eleições livres e diretas, um bando de petistas aloprados, inebriados pelo poder, transformem-se nos cupins da liberdade e da democracia.

Lula tem dito que não quer nem ouvir falar em permanecer no Palácio do Planalto. Jura passar a faixa ao sucessor eleito em 2010 da mesma forma que Fernando Henrique fez com ele. Mas o que o presidente Lula fala não se escreve.

Já foram tantas as promessas não cumpridas, as bravatas, as gafes, que fica difícil acreditar na sinceridade de intenções e palavras.

Ficar no poder tem sido uma tentação irresistível aos companheiros.

A própria personalidade do presidente acabará impulsionando a manobra do grupo dos quero-queros. O maior herói de Lula é ele mesmo que - do alto de sua vaidade sem limites - se julga um predestinado. Tão predestinado e tão candidato de si mesmo que jamais se preocupou em construir uma candidatura capaz de sucedê-lo dentro da normalidade. E a convivência despudoradamente amistosa com ditadores africanos “reeleitos”, para os quais o presidente não mede elogios, certamente foi inspiradora.

Tudo isso é um vexame do qual se darão conta rapidamente a imprensa internacional e os líderes políticos europeus e americanos que hoje vêem Lula com simpatia. Do pedestal de herói, como foi chamado pelo “New York Times”, passará à vala comum reservada a Chávez, Evo Morales e ditadores africanos de quinta categoria, os xodós do Itamaraty.

Será que diante de tamanho retrocesso o Brasil terá alguma chance de integrar o Conselho de Segurança da ONU? A soberba move os queremistas. Eles imaginam aprovar o terceiro mandato na Câmara sem resistência e duvidam da capacidade de mobilização da oposição, da classe média, daqueles que estão fartos de mentiras e casuísmos. Estão iludidos. Vão acabar como os pássaros daquela lenda gaúcha sobre a fuga da sagrada família para o Egito. Perseguidos pelos soldados de Herodes, José, Maria e o menino Jesus se escondiam e pediam silêncio aos bichos. Todos obedeciam, menos o quero-quero. Queria porque queria cantar.

E dizia: Quero! Quero! Quero! E tanto disse que foi amaldiçoado por Nossa Senhora: ficou querendo até hoje.

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ONYX LORENZONI é lider dos Democratas na Câmara dos Deputados.

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