segunda-feira, setembro 28, 2009

Pantomima

por Denis Lerrer Rosenfield*

A política exterior brasileira está enveredando, perigosamente, pelos caminhos bolivarianos, ditatoriais, que rompem com décadas de neutralidade e não ingerência em assuntos de outros países.

O caso de Honduras é, particularmente, aterrador, pois, em nome da democracia totalitária, estão sentando as bases de supressão da liberdade.

Façamos, primeiro, um breve retrospecto.

Lula e Amorim realizaram, nos últimos anos, périplos por países africanos, que têm em comum o menosprezo pela democracia e pelas liberdades em geral. Trata-se de países ditatoriais, que foram considerados pelo nosso governo como dignos parceiros de reconhecimento internacional. O exterrorista e ditador Kadhafi chegou a ser considerado como um irmão. Irmão de quê? De empreitadas ditatoriais, de uma pessoa há décadas no poder e exercendo uma dominação inflexível sobre o seu próprio povo.

Seguindo a mesma linha, a diplomacia brasileira permaneceu silenciosa sobre o genocídio do Sudão, onde mais de 200.000 pessoas foram assassinadas, não contabilizando aqui as pessoas esquartejadas, mutiladas e estupradas.

Em nome do quê? Da não ingerência nos assuntos de outros Estados.

Qual foi, então, o recado? Assassinar o seu próprio povo pode, em nome da soberania interna.

O caso do Irã, do “presidente? Ahmadinejad, foi — e continua — escandaloso.

As eleições foram fraudadas, o povo iraniano foi à rua, até alguns aiatolás já não suportam o despotismo em vigor naquele país, pessoas foram torturadas e assassinadas em prisões. O governo brasileiro se contentou em dizer que se tratava de um mero jogo de futebol, em que os perdedores tinham ficado insatisfeitos.

Na ONU, Lula, agora, reiterou a mesma posição de menosprezo aos direitos humanos. Temos uma prova tangível da podridão dessa esquerda que traiu, inclusive, os ideais de Marx. Fechou questão com o islamismo totalitário. Como se não bastasse, um “presidente?, que se caracteriza pelo antissemitismo militante, propugnando pela eliminação do Estado de Israel, é convidado a visitar o Brasil.

Provavelmente, em nome de uma qualquer "solidariedade" internacional, a dos déspotas.

Frente a esse quadro, que é um quadro de horror, a "nossa" diplomacia, ou melhor, a "deles", a dos bolivarianos com afinidades totalitárias, patrocina e é conivente com a volta de Zelaya a Honduras. Só um tolo acreditaria nas palavras de "diplomatas" (sic!), segundo os quais o Brasil só soube do ingresso do ex-presidente bolivariano, de tendências golpistas "democráticas", quando já tinha ingressado naquele país. Ainda conforme o nosso "chefe" do Itamaraty, deulhe "boas-vindas", oferecendo-lhe a hospitalidade brasileira. Pelo menos, Zelaya e sua mulher foram "honestos" ao agradecerem ao chanceler Amorim e ao presidente Lula o seu apoio.

Para acreditar na versão oficial, é necessário acreditar em duendes. Os cidadãos brasileiros são tidos por crédulos, mal-informados ou, melhor, tolos. Nada bate com nada nas versões oferecidas, salvo o seu objetivo de dar o máximo de sustentação ao projeto bolivariano do golpista fracassado Zelaya. O que é para eles insuportável é que ações inconstitucionais tenham sido abortadas pela Corte Suprema daquele país, pelo Legislativo e pelos militares. Querem encobrir tudo isto, dizendo que se tratou de um "golpe militar", que a América Latina não pode mais suportar.

O que pode a América Latina suportar? Deve suportar a subversão da democracia por meios democráticos, com destaque para eleições e assembleias constituintes. Deve suportar a eliminação da divisão de poderes, com líderes máximos solapando progressivamente todas as instituições representativas.

Deve suportar a eliminação da liberdade de imprensa, num cenário liberticida que relembra a vereda totalitária de uma esquerda, que já nem mais sabe o significado de valores universais.

As palavras começam a perder o seu sentido, ganhando um novo, que guarda uma remota ligação com o seu significado original.

A diplomacia brasileira fala que concedeu refúgio a Zelaya. Como assim? Ele estava sendo perseguido dentro de seu próprio país? Precisa ele de asilo? Ora, trata-se de uma pessoa que foi obrigada a deixar o poder por conspirar contra a Constituição. Por isto, foi ele conduzido para fora de seu próprio país, sem que tivesse sofrido dano físico, nem tenha estado a sua vida em perigo. O que a diplomacia brasileira fez foi patrocinar a sua volta a Honduras, em aliança com Hugo Chávez, que reconheceu ter organizado toda a operação.

O Brasil atrelou-se à Venezuela.

A diplomacia brasileira está se ingerindo nos assuntos internos de outro país, numa escancarada violação da Constituição brasileira, das Cartas da OEA e da ONU.

Numa completa tergiversação, o chanceler Amorim pede que o governo de Honduras não pratique nenhuma violência contra o bolivariano Zelaya.

Ora, é a diplomacia brasileira que está suscitando violência e tumulto naquele país. Os mortos já se contam. Os bolivarianos estão entrincheirados na embaixada, a partir da qual fazem manifestações públicas e organizam os seus partidários para levar a cabo o seu projeto de subversão da democracia. Como são politicamente corretos, dizem estar defendendo a democracia.

Na subversão do sentido das palavras, clamam que não reconhecerão as eleições em curso. Como assim? Por que elas estavam previstas na Constituição, antes mesmo da deposição de Zelaya? Não faz o menor sentido! As eleições seguem um cronograma constitucional, num regime de plenas liberdades, em particular de imprensa e partidária. É precisamente isto que se torna insuportável para esses socialistas autoritários.

Os países que parecem encantados com os cantos bolivarianos, como os EUA e os países europeus, estão cortando as fontes de financiamento deste pequeno país resistente. Enquanto isto, Lula negocia com Obama o fim do embargo comercial a Cuba. Deve estar fazendo isto em nome da democracia!

*DENIS LERRER ROSENFIELD é professor de filosofia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

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