quarta-feira, abril 29, 2009

O Brasil de todos nós: Raposa Serra do Sol

O tom de hoje contém uma única nota. O ritmo embala as profecias do sertanista Orlando Villas Boas. Talvez a crônica de uma só frase demonstre o retrato dos conflitos criados no Território de Roraima. Ou, quem sabe, nossa “pátria amada” esteja transformando os seus filhos, que há décadas habitam na reserva Raposa Serra do Sol, em grileiros e estrangeiros dentro de sua própria casa. O sertanista, pouco antes de sua morte em 2002, previu que, dentro de alguns anos, o país entenderia o significado da presença de milhares de ONGs (Organizações

não-Governamentais) espalhadas em ermas terras indígenas. Ele alertou que o Brasil seria ridicularizado por Estados estrangeiros, grandes empresas, igrejas, ambientalistas e cientistas, todos na ânsia da internacionalização da Amazônia. Na sua linha de pensamento, disse que a orquestra seria regida no tom da incompetência do Brasil para cuidar da nossa Amazônia. Villas Boas foi além disso, em seus discursos foi categórico ao afirmar que um “tsunami” estava por vir, quando alguns índios de destaque, de diversas etnias da região, fossem para América, voltassem falando inglês e tomados pela política. O estopim, apontado pelo sertanista, era o conflito nas terras de Roraima (localizada nas fronteiras com a Venezuela e a Guiana) e também um pedido dos Ianomâmis para se desmembrarem do Brasil, tendo a Organização das Nações Unidas (ONU) como tutora.

A complexidade do caso está na escolha de um único lado e também da divisão em castas privilegiadas. Como definir quem é brasileiro de verdade? Como alegar a legitimidade dos índios e dos não-índios? Não se trata apenas de mais um conflito entre índios e arrozeiros; estamos falando de um assunto de interesse nacional. O governo ofereceu aos 17 mil índios da Raposa Serra do Sol, de etnias diferentes, uma área contínua de 1,7 milhão de hectares. Hoje o Brasil tem aproximadamente 600 terras indígenas, 227 povos, chegando ao total de 480 mil habitantes. Os indígenas ocupam 27% da Amazônia Legal, que inclui os Estados de Tocantins, Mato Grosso, Roraima, Rondônia, Pará, Amapá, Acre e Amazonas. De acordo com o general do exército Augusto Heleno de Freitas, especialista em Amazônia, a cobiça internacional não se manifesta em ações claras, mas dissimuladas e pouco transparentes. “Fica difícil entender por que pouquíssimas ONGs dedicam-se a socorrer a população nordestina enquanto centenas delas trabalham junto às populações indígenas”, afirmou o general Heleno em entrevista ao programa “Canal Livre”, da Band - em abril de 2008. Declarações de especialistas em Amazônia, como o general Heleno, demonstram que o formato definido na decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), no último dia 18 de março, em manter a demarcação em faixa contínua da reserva Raposa Serra do Sol, evidencia a vulnerabilidade do Brasil, diante de interesses externos, embora, tenho a absoluta certeza, o julgamento não tenha tido esse propósito.

O presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, disse que o resultado do julgamento servirá como parâmetro para outras demarcações em fronteiras com a participação do Estado. “O desenho sobre o novo estatuto para a terra indígena valerá para o caso Raposa Serra do Sol e também balizará as questões em andamento". Por 10 votos a um, o Supremo manteve a demarcação da reserva. Apenas o ministro Marco Aurélio de Mello foi contra a decisão, por acreditar que o processo de demarcação presume a participação de diversos interessados. Durante as seis horas de leitura das 120 páginas do seu voto, o ministro sugeriu que o processo fosse extinto. Apontou falhas na ação, alegando omissões de averiguação pelo STF no processo da demarcação. O ministro foi além, dizendo que foi desobedecida a legislação, ao não serem ouvidas todas as partes envolvidas. Compreendo o voto do ministro como a tradução de um olhar humano diante da situação caótica provocada pela demarcação. O ministro foi leal aos seus princípios e desafiou os interesses envolvidos no caso. Ele fez sua parte, mas o fogo na floresta não foi contido; mesmo assim, sua ideologia permaneceu no seu voto, com fundamentos jurídicos e humanistas.

O artigo de Aldo Rabelo, deputado federal pelo PCdoB-SP, intitulado “O erro em Roraima”, ironiza, dizendo que até as pedras sabiam que o Supremo iria agredir a formação social brasileira, ao expulsar os não-índios: “{...} a decisão correta a tomar era acomodar os direitos de índios (incluindo os que são contra a demarcação da reserva em área contínua e apoiam a presença de arrozeiros) e de outros brasileiros que lá se estabeleceram, no modelo secular de ocupação do território. É um truísmo reconhecer que os nordestinos, goianos e gaúchos que arribam para a Amazônia repetem a epopeia dos bandeirantes, e sua presença não significa um esbulho dos direitos indígenas. Até as pedras sabiam que nesses conflitos intestinos não pode haver derrotados, e só se admite um vencedor: a Nação e os interesses permanentes de seu povo”.

Quando falamos da retirada dos não-índios, falamos de pessoas que ali nasceram e construíram os seus sonhos, sua vida e depositaram um mar de esperanças em dias melhores. Esses brasileiros são vítimas da ausência do Estado e da falta de projetos sustentáveis. São pessoas com mais de 90 anos, brasileiros que desbravaram a Amazônia e hoje são expulsos das suas casas sem explicação concreta. Tal atitude reflete gritante dualismo, pois, se de um lado emergimos de um conceito de independência e imparcialidade em face dos índios, de outro imergimos na conclusão de que não sabemos gerenciar a situação dos não-índios que habitam naquelas terras e sempre conviveram de forma fraternal com os povos indígenas. A disputa por uma fatia farta da Amazônia faz com que os interesses externos estrangulem o potencial brasileiro e causem desunião entre o seu povo multiétnico. Vivemos num país democrático, mas acabamos surpreendidos com armadilhas provocadas por interesses escusos. Para o sociólogo Demétrio Magnoli, no artigo “Roraima é aqui”, o caminho traçado pela demarcação será maculado por recurso de violência entre os índios e os não-índios. Ele salienta que a criação de uma nação indígena em Roraima levanta questões importantes quanto à demarcação na reserva e à permanência, do lado de dentro, das ONGs internacionais, missionários e índios: “há ‘nações indígenas’ distintas da nação brasileira? A pergunta carece sentido, pois nações não existem na natureza, como rio e montanhas, mas são inventadas na esfera da política. Os índios ‘originais’ não podem ser restaurados, mas sempre é possível inventar, debaixo dos escombros da idéia da nação única, ‘nações indígenas’ pós-modernas, financiadas por instituições multilaterais e lideradas por coalizões de ativistas bem conectados e índios globalizados”.

Não precisamos ir muito longe para enxergar o caos provocado por interesses internacionais. Como presidente do Tribunal de Justiça de Rondônia, pude conhecer a realidade da reserva indígena Karitiana, localizada a 100 quilômetros de Porto Velho. Fiquei convencida dos estragos causados por ONGs que usufruíram da influência internacional para abrir o cerco para a biopirataria, entre outros crimes. Também pude ver que os índios estão sendo beneficiados com a modernidade do nosso século. Na aldeia, existem geladeira, televisão, rádio e inúmeros aparelhos eletrônicos. Hoje os índios estão aculturados e usufruem dos benefícios da cultura dos não-índios. Em algumas horas de conversas com o cacique da aldeia central, Antônio Karitiana, ouvi relato de que inúmeras organizações estiveram lá e colheram sangue dos indígenas, sob a condição de trazer remédios para a tribo. Enfurecido, o cacique alega que a promessa nunca foi cumprida, e, por isso, nenhuma ONG tem permissão para entrar na reserva Karitiana. No dia 21 de junho de 2007, o jornal “New York Times” publicou uma reportagem denunciando a venda de sangue e DNA dos Karitianas por uma empresa americana. Logo após a minha primeira visita à aldeia, os índios fizeram um pedido de doação de computadores para a comunidade. No dia da entrega da doação, o administrador da Associação Karitiana, Renato Karitiana, ressaltou que os computadores doados pelo Judiciário de Rondônia vão levar a inclusão digital para a comunidade: “Os computadores chegaram em boa hora. Vamos utilizá-los para organizar os documentos que contam nossa história e também fazer com que os nossos índios se tornem globalizados". A doação ganhou repercussão nacional e me fez refletir sobre a visão e a missão do Judiciário em oferecer à sociedade acesso de qualidade à Justiça, solucionando conflitos com rapidez e garantindo a paz social. Estou convencida da dívida com a nossa história indígena, mas não posso calar-me diante da violência que está sendo articulada contra brasileiros dentro do seu território. Sinto a mesma indignação causada pelo crime contra os índios Karitianas. Posso afirmar que os não-índios da Raposa Serra do Sol são tão brasileiros quanto os índios Karitianas.

Posso dizer que os moradores de Roraima atingidos pela decisão judiciária estão marcados por toda vida. Sou roraimense nascida na região do rio Cotingo, hoje Raposa Serra do Sol, e lá construí os meus sonhos, constituí família e idealizei um Estado promissor. Amo minha terra, minha gente e demonstro, neste momento, minha indignação diante dos fatos ocorridos. Não seria necessário um provimento judicial, mas um gerenciamento oportuno, imparcial e preventivo. Nossos índios são aculturados. Sinto saudade daquela época em que índios e não-índios dividiam, em plena harmonia, o mesmo espaço, o mesmo ar e a mesma terra. Muitas famílias já deixaram o local e hoje estão na cidade perdidas em tristeza. O STF é guardião da Constituição Federal. Sua decisão deve ser respeitada, e a ela nos curvamos, embora com o coração destruído. Termina no dia 30 de abril o prazo final para a retirada dos arrozeiros e fazendeiros da Raposa Serra do Sol.

O cerco está fechado!

O arroz não está pronto para colheita. Seria oportuno um prazo maior do que o estipulado na decisão. Todos os investimentos serão perdidos? São mais de 15 mil cabeças de gado pelos pastos da reserva! E a pergunta crucial é: Para onde vão todas as pessoas?

São questões que atormentam os proprietários e todos os cidadãos brasileiros. É justo?

Zelite Andrade Carneiro
Cidadã brasileira

quinta-feira, abril 23, 2009

Transcrição do bate-boca no STF

Direito – O tema é exatamente igual.

Peluso – Mas as conseqüências são de uma gravidade... é a anulação de todos os processos criminais já julgados, cumprimento de penas, etc.

Carmen – A questão da modulação é que é a mesma, mas a matéria.

Direito – Se vossa excelência quiser tirar de pauta.

Cármen – Talvez fosse de conveniência que esse aqui não fosse julgada agora, presidente.

Mendes – É a prova que é preciso embargos de declaração nesse tipo de matéria.

Barbosa – No caso anterior era embargos de declaração para dar aposentadoria a notários. Aqui, embargos de declaração para impedir o desfazimento...

Mendes – Não se trata disso.

Barbosa – Se trata disso, ministro Gilmar.

Mendes – Não, nada disso, desculpa.

Barbosa – A lei fala expressamente ...

Mendes – ... de aposentadoria de pessoas, vossa excelência que está colocando... não é nada disso. O parâmetro ideológico é vossa excelência que está dando. Porque senão aí o causuísmo fica por conta dos eventuais interessados.

Barbosa - Pois é. Nós deveríamos ter discutido quem seriam os beneficiados.

Mendes – A doutrina responsável defende essa possibilidade de que, cito Rui Medeiros e outros, de que se houver omissão, porque é dever do tribunal, ele próprio perquirir, não se trata de fazer defesa de A ou B, esse discurso de classe não cola.

JB – Porque a decisão era uma decisão de classe.

GM – Não, não era decisão de classe.

JB – Era sim.

GM – Não.

(espera)

CP – Agora. O tribunal tem a sua exigência de coerência.

GM – O tribunal pode aceitar ou rejeitar, mas não com o argumento de classe. Isso faz parte de impopulismo judicial.

JB – Eu acho que o segundo caso prova muito bem a justeza da sua tese. Mas a sua tese ela deveria ter sido exposta em pratos limpos. Nós deveríamos estar discutindo ...

GM – Ela foi exposta em pratos limpos. Eu não sonego informação. Vossa Excelência me respeite. Foi apontada em pratos limpos.

JB – Não se discutiu a lei...

GM – Se discutiu claramente.

JB – Não se discutiu

GM – Se discutiu claramente e eu trouxe razão. Vossa Excelência... Talvez Vossa Excelência esteja faltando às sessões.

JB – Eu não estou...

GM – Tanto é que Vossa Excelência não tinha votado. Vossa Excelência faltou a sessão.

JB – Eu estava de licença, ministro.

GM – Vossa Excelência falta a sessão e depois vem...

JB – Eu estava de licença. Vossa Excelência não leu aí. Eu estava de licença do tribunal.

GM – Portanto...

CB – Senhor presidente, eu vou pedir vista do processo.

GM – Ministro Direito rejeita...

MD – Estou mantendo a coerência. Para mim não existe distinção. Nós estávamos discutindo a tese, que foi posta claramente, de saber se, havendo não decisão alguma, nem constando do pedido, a questão dos efeitos modulados se caberia ou não caberia embargo de declaração. Eu já estou com esse processo em pauta há muito tempo, mas como havia um outro que já estava em curso, eu aguardei julgar o outro que estava em curso. A tese é exatamente a mesma e eu estou rejeitando os embargos com esse fundamento.

CP – Se Vossa Excelência me permite, eu acho que há uma distinção aqui. No caso anterior, nós discutimos e conhecemos dos embargos. Os embargos foram rejeitados. Em outras palavras, o tribunal considerou admissíveis os embargos de declaração e rejeitou. Neste caso nós podemos considerar conhecer dos embargos e agora temos de discutir se nós vamos ou não vamos conceder esse efeito limitado.

MD – Ministro Peluso, se vossa excelência me permite, eu compreendo perfeitamente a tese que vossa excelência está sustentando. Só que é exatamente o caso, eu estou conhecendo dos embargos e estou rejeitando pelo menos fundamento que nós adotamos como foi claramente discutido aqui. A única diferença que pode existir é quanto à matéria substantiva. Mas quanto à tese que está sendo observada nos embargos de declaração ela é absolutamente idêntica. É prudente, claro, diante das advertências que foram feitas – e essa corte faz isso com absoluta tranqüilidade sempre, com absoluta transparência, sempre – que se examine e se reexamine a jurisprudência. Não é uma coisa santificada.

GM – E não teve outro caso, se não me engano do Rio Grande do Sul, em que o tribunal – não sei se era matéria de concurso ou coisa assemelhada – em que se discutiu também em embargos de declaração porque o próprio tribunal do Rio Grande do Sul fazia advertência das conseqüências, e o tribunal houve por bem rejeitar os embargos, mas não os disse inadimissíveis.

MD – Eu não estou entendendo que é inadimissível também. Estou conhecendo dos embargos, porque os embargos podem ser conhecidos. Como é uma tese que estava em controvérsia eu estou rejeitando os embargos pela mesma fundamentação. Mas o ministro Carlos Britto vai pedir vista do processo. Quem sabe Sua Excelência, examinando o processo, encontre uma omissão que eu não encontrei e nessa omissão (densa essa corte de supri-la) e, suprindo-a, acolher os embargos também com a extensão dos efeitos modulativos, não em função da omissão dos efeitos modulativos, mas sim em razão de uma outra eventual omissão que possa ter existido.

CP – Essa matéria é de uma delicadeza extrema.

CB – Vai ser muito difícil divergir de Sua Excelência.

CP – Significa a anulação de todos os processos julgados em execução desde 2005.

CL – De 2002 a 2005.

GM – Portanto, após o voto do relator que rejeitava os embargos, pediu vista o ministro Carlos Britto. Eu só gostaria de lembrar em relação a esses embargos de declaração que esse julgamento iniciou-se em 17/03/2008 e os pressupostos todos foram explicitados, inclusive a fundamentação teórica. Não houve, portanto, sonegação de informação.

CB – Tá bem claro.

JB – Eu não falei em sonegação de informação, ministro Gilmar. O que eu disse: nós discutimos naquele caso anterior sem nos inteirarmos totalmente das conseqüências da decisão, quem seriam os beneficiários. E é um absurdo, eu acho um absurdo.

Mendes – Quem votou sabia exatamente que se trata de pessoas...

Barbosa – Eu chamei a atenção de vossa excelência.

Peluso – Não, mas eu já tinha votado porque compreendia uma classe toda de serventuários não remunerados.

Barbosa – Só que a lei, ela tinha duas categorias.

Peluso – Não apenas notários.

Barbosa – Tinha uma vírgula e, logo em seguida, a situação de uma lei. Qual era essa lei? A lei dos notários. Qual era a conseqüência disso? Incluir notários nos regimes de aposentadorias de servidores ...

Mendes – porque pagaram por isso durante todo o período e vincularam...

Barbosa – ora, porque pagaram...

Mendes – se vossa excelência julga por classe, esse é um argumento...

Barbosa – eu sou atento às conseqüências da minha decisão, das minhas decisões. Só isso.

Mendes – vossa excelência não tem condições de dar lição a ninguém.

Barbosa – e nem vossa excelência. Vossa excelência me respeite, vossa excelência não tem condição alguma. Vossa excelência está destruindo a justiça desse país e vem agora dar lição de moral em mim? Saia a rua, ministro Gilmar. Saia a rua, faz o que eu faço.

Britto – ministro Joaquim, nós já superamos essa discussão com o meu pedido de vista.

Barbosa – Vossa excelência não nenhuma condição.

Mendes – eu estou na rua, ministro Joaquim.

Barbosa – vossa excelência não está na rua não, vossa excelência está na mídia, destruindo a credibilidade do Judiciário brasileiro. É isso.

Britto – ministro Joaquim, vamos ponderar.

Barbosa – vossa excelência quando se dirige a mim não está falando com os seus capangas do Mato Grosso, ministro Gilmar. Respeite.

Mendes – ministro Joaquim, vossa excelência me respeite.

Marco Aurélio – presidente, vamos encerrar a sessão?

Barbosa – Digo a mesma coisa.

Marco Aurélio – eu creio que a discussão está descambando para um campo que não se coaduna com a liturgia do Supremo.

Barbosa – Também acho. Falei. Fiz uma intervenção normal, regular. Reação brutal, como sempre, veio de vossa excelência.

Mendes – não. Vossa excelência disse que eu faltei aos fatos e não é verdade.

Barbosa – não disse, não disse isso.

Mendes – Vossa excelência sabe bem que não se faz aqui nenhum relatório distorcido.

Barbosa – não disse. O áudio está aí. Eu simplesmente chamei a atenção da Corte para as consequências da decisão e vossa excelência veio com a sua tradicional gentileza e lhaneza.

Mendes – é vossa excelência que dá lição de lhaneza ao Tribunal. Está encerrada a sessão.

sábado, abril 04, 2009

A Operação Royalties

por Diogo Mainard

"Victor Martins está sendo investigado pela PF.Ele é diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP). É também irmão do ministro da Propaganda de Lula, Franklin Martins"

Victor Martins está sendo investigado pela Polícia Federal. Num relatório interno, sigiloso, ele é tratado como suspeito de comandar um esquema de desvio de 1,3 bilhão de reais da Petrobras.

Quem é Victor Martins? Já tratei dele alguns anos atrás. Talvez alguém ainda se lembre. Ele é diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP). É também irmão do ministro da Propaganda de Lula, Franklin Martins.

Vamos lá. Ponto por ponto. Em meados de 2007, a PF prendeu treze pessoas na Operação Águas Profundas. Elas eram acusadas de fraudar e superfaturar contratos com a Petrobras. Durante as investigações, os agentes da polícia fazendária do Rio de Janeiro descobriram outro esquema fraudulento, envolvendo empresas de consultoria, prefeituras e a ANP. Segundo a denúncia, tratava-se de um esquema de desvio de dinheiro de royalties do petróleo. A PF abriu uma nova investigação, batizada de Operação Royalties.

Nos primeiros meses de 2008, o delegado responsável pela Operação Royalties preparou um relatório sobre o resultado de suas investigações. O que tenho na minha frente, no computador, é justamente isto: a cópia integral desse relatório.

De acordo com os dados recolhidos pelos agentes da PF, Victor Martins, apesar de ser diretor da ANP, continuaria a se ocupar dos interesses da Análise Consultoria e Desenvolvimento, empresa da qual ele seria sócio com sua mulher, Josenia Bourguignon Seabra. Victor Martins se valeria de seu cargo para direcionar os pareceres da ANP sobre a concessão de royalties do petróleo, favorecendo as prefeituras que aceitassem contratar os préstimos de sua empresa de consultoria. Num episódio descrito pela PF – e reproduzo o trecho mais escandaloso do relatório –, Victor Martins "estaria ajeitando uma cobrança de royalties da Petrobras, no valor de R$ 1 300 000 000,00 (um bilhão e trezentos milhões de reais), através da Análise Consultoria, e teria uma comissão de R$ 260 000 000,00 (duzentos e sessenta milhões de reais), a título de honorários".

O relatório da PF, com todos os detalhes sobre o esquema e o nome dos supostos cúmplices de Victor Martins na ANP, foi apresentado a Luiz Fernando Corrêa, diretor-geral da PF. O que aconteceu depois disso? Primeiro: a Operação Royalties, que estava a um passo de ser deflagrada, com as primeiras prisões, foi posta de molho. Segundo: o delegado que dirigia as investigações foi transferido. Terceiro: o chefe da polícia fazendária do Rio de Janeiro foi trocado. Quarto: o superintendente da PF carioca, Valdinho Jacinto Caetano, foi promovido ao cargo de corregedor-geral, em Brasília.

É bom lembrar: Victor Martins só está sendo investigado pela PF. Ninguém o acusou judicialmente. Ninguém o condenou. Mas os parlamentares do PSDB e do DEM passaram a semana fazendo de conta que instituiriam uma CPI da Petrobras. O motivo: segundo eles, a PF abafaria as denúncias contra petistas e membros do governo, como na Operação Castelo de Areia. Se é assim, a Operação Royalties parece confirmar essa tese. CPI da Petrobras. Já.